Área técnica do Tribunal de Contas da União diverge de
auditora que isentou Conselho de Administração
no caso de Pasadena — propõe bloquear bens de Dilma e
ex-integrantes do Conselho
auditora que isentou Conselho de Administração
no caso de Pasadena — propõe bloquear bens de Dilma e
ex-integrantes do Conselho
Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA) |
Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) pede que ex-integrantes
do Conselho de Administração da Petrobrás, entre eles a ex-presidente
Dilma Rousseff, sejam responsabilizados e tenham os bens bloqueados por
perdas na compra da Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA). É a primeira
vez que o setor de auditoria da corte propõe tornar indisponível o
patrimônio dos ex-conselheiros por prejuízos no negócio, investigado na
Operação Lava Jato.
A área técnica do tribunal analisa a culpa de Dilma e de outros ex-membros do colegiado também nas maiores obras da estatal.
O parecer foi concluído no dia 19.set.2016 e é subscrito pelo chefe da
Secretaria de Controle Externo da Administração Indireta do TCU no Rio
de Janeiro (Secex Estatais), Luiz Sérgio Madeiro da Costa. Ele divergiu
de auditora que avaliou a transação e, dias antes, havia reiterado
entendimento do tribunal de isentar o conselho, aplicando sanções apenas
a ex-dirigentes que tinham funções executivas. Desde 2014, ex-diretores
da companhia têm os bens bloqueados.
Dilma era ministra da Casa Civil do governo Lula e presidente do
Conselho de Administração em 2006, quando foi aprovada a aquisição dos
primeiros 50% da refinaria. O secretário pede que os ex-conselheiros
sejam considerados responsáveis solidários por perdas de ao menos US$
266 milhões (R$ 858,3 milhões). O bloqueio, inicialmente por um ano,
visa a cobrir eventual ressarcimento à estatal.
Além de Dilma, estão na lista o ex-ministro Antonio Palocci (Fazenda e
Casa Civil), os empresários Cláudio Haddad e Fábio Barbosa, o general
Gleuber Vieira e o ex-presidente da companhia José Sergio Gabrielli —
como integrava também a Diretoria Executiva, este último já está com os
bens bloqueados. O grupo participou da reunião que aprovou a compra em
2006.
A estatal pagou, inicialmente, US$ 359 milhões ao grupo belga Astra Oil,
que, no ano anterior, havia desembolsado US$ 42 milhões por 100% dos
ativos. Em março de 2014, se revelou que a então presidente da
República votou a favor do negócio. Ela disse que só deu seu aval porque
se baseou em “resumo tecnicamente falho” que omitia cláusulas das
quais, se tivesse conhecimento, não aprovaria.
Após um desacordo, a Astra acionou uma dessas cláusulas, que lhe
assegurava o direito de vender sua fatia em Pasadena à estatal. Em 2012,
a Petrobrás pagou US$ 820 milhões pelos 50% remanescentes à empresa
belga. Em 2014, ao bloquear bens de ex-diretores, o TCU concluiu que a
perda total pela compra foi de US$ 792 milhões (R$ 2,5 bilhões).
Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA) |
Em relatório anexado a um desses processos, que traz a análise sobre a
maior parte das perdas (US$ 580 milhões ou R$ 1,8 bilhão), a auditora da
Secex Estatais Maria Lúcia Samico defendeu responsabilizar não só os
ex-diretores já implicados em 2014, mas outros cinco ex-funcionários da
Petrobrás que negociaram com a Astra. No entanto, reiterou que o
conselho não tem culpa pelos prejuízos, pois não detinha as informações
necessárias para antever que o negócio seria nocivo. O parecer não
discute as delações premiadas da Lava Jato, entre elas a do ex-diretor
da Petrobrás Nestor Cerveró, informando que Dilma conhecia em detalhes a
compra.
‘Dever de diligência’ — O chefe da secretaria contestou as
conclusões. Para ele, Dilma e os demais ex-integrantes do conselho
descumpriram normativos da Petrobrás e a Lei das Sociedades por Ações ao
não “acompanhar a gestão da Diretoria Executiva” por meio da “análise
devida das bases do negócio” e ao não solicitar “esclarecimentos mais
detalhados sobre a operação”, antes de autorizá-la. Com isso, argumenta
ele, violaram o “dever de diligência” para com a companhia.
Os pareceres foram enviados ao relator dos processos, ministro Vital do
Rêgo, e ao procurador-geral do MP de Contas, Paulo Bugarin, que vão
apresentar suas considerações. Depois, o caso será pautado para
julgamento. Não há previsão.
Defesa — A ex-presidente Dilma Rousseff informou, em nota,
que o assunto Pasadena “é antigo e já foi arquivado em 2014 pelo
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por considerar que nem ela
nem os demais ex-conselheiros de Administração da Petrobrás tiveram
responsabilidade pelos eventuais prejuízos”.
“De acordo com o procurador-geral, as informações prestadas por Dilma
Rousseff, ainda em 2014, 'afastam a acusação de conduta dolosa ou
culposa que possa ser atribuída ao conselho de ter dado causa aos
prejuízos advindos da referida operação'”, diz o comunicado.
A ex-presidente ressalta, no texto, que o próprio TCU a “excluiu” do
processo em 2014, justamente por considerar que o Conselho de
Administração “não havia sido devidamente informado de todas as
cláusulas no processo de aquisição de Pasadena”.
“Sobre o relatório técnico a ser apresentado ao pleno do TCU —
encaminhado seletivamente e de maneira inusual à reportagem —, Dilma
Rousseff reafirma que estranha a posição da auditoria, contrária à do
procurador-geral da República”, diz trecho do comunicado.
Dilma explicou a Janot as circunstâncias da parceria entre a Petrobrás e
a Astra Oil. O negócio foi submetido ao Conselho de Administração em 3
de fevereiro de 2006 por meio de resumo executivo e de apresentação do
então diretor Internacional Nestor Cerveró. Na nota, ela reitera que
Cerveró não fez referência a “duas importantes cláusulas”. “Como se
tornou evidente, o Conselho de Administração não teve conhecimento sobre
as referidas cláusulas.”
A nota diz ainda que o Conselho de Administração não autorizou a
“aquisição voluntária” dos 50% restantes das ações de Pasadena, em
2008. “Diante desses esclarecimentos, o procurador-geral determinou o
arquivamento do caso, reconhecendo que o conselho 'não foi adequadamente
informado acerca do conteúdo do contrato'”, destacou.
O ex-ministro Antônio Palocci informou, por meio de sua assessoria, que
ele e seus advogados não têm conhecimento da “nota técnica” e que não
foi notificado “a respeito de qualquer procedimento” do tribunal.
“Portanto, não irá se manifestar sobre o assunto”, justificaram os
auxiliares do ex-ministro.
A reportagem entrou em contato com a secretária de Cláudio Haddad por
telefone e e-mail. Ela explicou que ele só poderia se pronunciar a
partir de segunda-feira (26.set.2016).
Fábio Barbosa não quis se manifestar.
Gleuber Vieira disse que desconhece o parecer do tribunal e que não
poderia comentá-lo em detalhes. Ele ponderou, contudo, que o Conselho de
Administração apenas aprovou a compra, sem observar maiores detalhes,
levando em conta parecer jurídico e os objetivos estratégicos da
Petrobrás naquele momento.
O advogado de José Sérgio Gabrielli, Antônio Perilo, disse que um dos
pareceres recentemente apresentados pelos técnicos do TCU acolhe
argumentos de seu cliente. Em nota, ele alegou que a auditoria admite
que a carta de intenções do negócio não foi autorizada por Gabrielli e
que ela “não acarretou nenhum prejuízo”.
“O tribunal reconhece que foram equivocadas certas metodologias de
aferição de dano ao erário que vinham sendo utilizadas. Esse é um
primeiro passo para abordar a questão como ela deveria ter sido feita
desde o início: como a análise da medida em que certas estratégias
comerciais e negociais eram compatíveis com os interesses da empresa”,
comentou.
O defensor afirma que o TCU repete, na aquisição de Pasadena, a mesma
metodologia que usa na análise do superfaturamento de contratos público.
“Essa metodologia é útil para saber se um contrato praticou preços
acima do mercado, na aquisição de bens e serviços que são disponíveis e
poderiam ser adquiridos pelo preço médio. Contudo, é inaplicável para
situações comerciais como a de Pasadena, em que o lucro ou prejuízo não
podia ser calculado dessa forma”, criticou, acrescentando que a defesa
trabalha numa nova manifestação para enfrentar “todos os argumentos
trazidos aos autos” pela área técnica.
A ex-presidente da Petrobrás Maria das Graças Foster não comentou.
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