domingo, 25 de setembro de 2016

Área técnica do Tribunal de Contas da União diverge de
auditora que isentou Conselho de Administração
no caso de Pasadena — propõe bloquear bens de Dilma e
ex-integrantes do Conselho



Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA)


Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) pede que ex-integrantes do Conselho de Administração da Petrobrás, entre eles a ex-presidente Dilma Rousseff, sejam responsabilizados e tenham os bens bloqueados por perdas na compra da Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA). É a primeira vez que o setor de auditoria da corte propõe tornar indisponível o patrimônio dos ex-conselheiros por prejuízos no negócio, investigado na Operação Lava Jato. 
A área técnica do tribunal analisa a culpa de Dilma e de outros ex-membros do colegiado também nas maiores obras da estatal.
O parecer foi concluído no dia 19.set.2016 e é subscrito pelo chefe da Secretaria de Controle Externo da Administração Indireta do TCU no Rio de Janeiro (Secex Estatais), Luiz Sérgio Madeiro da Costa. Ele divergiu de auditora que avaliou a transação e, dias antes, havia reiterado entendimento do tribunal de isentar o conselho, aplicando sanções apenas a ex-dirigentes que tinham funções executivas. Desde 2014, ex-diretores da companhia têm os bens bloqueados.
Dilma era ministra da Casa Civil do governo Lula e presidente do Conselho de Administração em 2006, quando foi aprovada a aquisição dos primeiros 50% da refinaria. O secretário pede que os ex-conselheiros sejam considerados responsáveis solidários por perdas de ao menos US$ 266 milhões (R$ 858,3 milhões). O bloqueio, inicialmente por um ano, visa a cobrir eventual ressarcimento à estatal.
Além de Dilma, estão na lista o ex-ministro Antonio Palocci (Fazenda e Casa Civil), os empresários Cláudio Haddad e Fábio Barbosa, o general Gleuber Vieira e o ex-presidente da companhia José Sergio Gabrielli — como integrava também a Diretoria Executiva, este último já está com os bens bloqueados. O grupo participou da reunião que aprovou a compra em 2006.
A estatal pagou, inicialmente, US$ 359 milhões ao grupo belga Astra Oil, que, no ano anterior, havia desembolsado US$ 42 milhões por 100% dos ativos. Em março de 2014, se  revelou que a então presidente da República votou a favor do negócio. Ela disse que só deu seu aval porque se baseou em “resumo tecnicamente falho” que omitia cláusulas das quais, se tivesse conhecimento, não aprovaria.
Após um desacordo, a Astra acionou uma dessas cláusulas, que lhe assegurava o direito de vender sua fatia em Pasadena à estatal. Em 2012, a Petrobrás pagou US$ 820 milhões pelos 50% remanescentes à empresa belga. Em 2014, ao bloquear bens de ex-diretores, o TCU concluiu que a perda total pela compra foi de US$ 792 milhões (R$ 2,5 bilhões).



Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA)


Em relatório anexado a um desses processos, que traz a análise sobre a maior parte das perdas (US$ 580 milhões ou R$ 1,8 bilhão), a auditora da Secex Estatais Maria Lúcia Samico defendeu responsabilizar não só os ex-diretores já implicados em 2014, mas outros cinco ex-funcionários da Petrobrás que negociaram com a Astra. No entanto, reiterou que o conselho não tem culpa pelos prejuízos, pois não detinha as informações necessárias para antever que o negócio seria nocivo. O parecer não discute as delações premiadas da Lava Jato, entre elas a do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró, informando que Dilma conhecia em detalhes a compra.

‘Dever de diligência’ — O chefe da secretaria contestou as conclusões. Para ele, Dilma e os demais ex-integrantes do conselho descumpriram normativos da Petrobrás e a Lei das Sociedades por Ações ao não “acompanhar a gestão da Diretoria Executiva” por meio da “análise devida das bases do negócio” e ao não solicitar “esclarecimentos mais detalhados sobre a operação”, antes de autorizá-la. Com isso, argumenta ele, violaram o “dever de diligência” para com a companhia.
Os pareceres foram enviados ao relator dos processos, ministro Vital do Rêgo, e ao procurador-geral do MP de Contas, Paulo Bugarin, que vão apresentar suas considerações. Depois, o caso será pautado para julgamento. Não há previsão.




Defesa — A ex-presidente Dilma Rousseff informou, em nota, que o assunto Pasadena “é antigo e já foi arquivado em 2014 pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por considerar que nem ela nem os demais ex-conselheiros de Administração da Petrobrás tiveram responsabilidade pelos eventuais prejuízos”.
“De acordo com o procurador-geral, as informações prestadas por Dilma Rousseff, ainda em 2014, 'afastam a acusação de conduta dolosa ou culposa que possa ser atribuída ao conselho de ter dado causa aos prejuízos advindos da referida operação'”, diz o comunicado.
A ex-presidente ressalta, no texto, que o próprio TCU a “excluiu” do processo em 2014, justamente por considerar que o Conselho de Administração “não havia sido devidamente informado de todas as cláusulas no processo de aquisição de Pasadena”.
“Sobre o relatório técnico a ser apresentado ao pleno do TCU — encaminhado seletivamente e de maneira inusual à reportagem —, Dilma Rousseff reafirma que estranha a posição da auditoria, contrária à do procurador-geral da República”, diz trecho do comunicado.
Dilma explicou a Janot as circunstâncias da parceria entre a Petrobrás e a Astra Oil. O negócio foi submetido ao Conselho de Administração em 3 de fevereiro de 2006 por meio de resumo executivo e de apresentação do então diretor Internacional Nestor Cerveró. Na nota, ela reitera que Cerveró não fez referência a “duas importantes cláusulas”. “Como se tornou evidente, o Conselho de Administração não teve conhecimento sobre as referidas cláusulas.”
A nota diz ainda que o Conselho de Administração não autorizou a “aquisição voluntária”  dos 50% restantes das ações de Pasadena, em 2008. “Diante desses esclarecimentos, o procurador-geral determinou o arquivamento do caso, reconhecendo que o conselho 'não foi adequadamente informado acerca do conteúdo do contrato'”, destacou.

O ex-ministro Antônio Palocci informou, por meio de sua assessoria, que ele e seus advogados não têm conhecimento da “nota técnica” e que não foi notificado “a respeito de qualquer procedimento” do tribunal. “Portanto, não irá se manifestar sobre o assunto”, justificaram os auxiliares do ex-ministro.

A reportagem entrou em contato com a secretária de Cláudio Haddad por telefone e e-mail. Ela explicou que ele só poderia se pronunciar a partir de segunda-feira (26.set.2016).

Fábio Barbosa não quis se manifestar.

Gleuber Vieira disse que desconhece o parecer do tribunal e que não poderia comentá-lo em detalhes. Ele ponderou, contudo, que o Conselho de Administração apenas aprovou a compra, sem observar maiores detalhes, levando em conta parecer jurídico e os objetivos estratégicos da Petrobrás naquele momento.

O advogado de José Sérgio Gabrielli, Antônio Perilo, disse que um dos pareceres recentemente apresentados pelos técnicos do TCU acolhe argumentos de seu cliente. Em nota, ele alegou que a auditoria admite que a carta de intenções do negócio não foi autorizada por Gabrielli e que ela “não acarretou nenhum prejuízo”.
“O tribunal reconhece que foram equivocadas certas metodologias de aferição de dano ao erário que vinham sendo utilizadas. Esse é um primeiro passo para abordar a questão como ela deveria ter sido feita desde o início: como a análise da medida em que certas estratégias comerciais e negociais eram compatíveis com os interesses da empresa”, comentou.
O defensor afirma que o TCU repete, na aquisição de Pasadena, a mesma metodologia que usa na análise do superfaturamento de contratos público. “Essa metodologia é útil para saber se um contrato praticou preços acima do mercado, na aquisição de bens e serviços que são disponíveis e poderiam ser adquiridos pelo preço médio. Contudo, é inaplicável para situações comerciais como a de Pasadena, em que o lucro ou prejuízo não podia ser calculado dessa forma”, criticou, acrescentando que a defesa trabalha numa nova manifestação para enfrentar “todos os argumentos trazidos aos autos” pela área técnica.

A ex-presidente da Petrobrás Maria das Graças Foster não comentou.




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