sexta-feira, 12 de junho de 2015


Operação da Polícia Federal encontra conta de estatal da Venezuela

A Polícia Federal (PF) identificou a evasão de ao menos US$ 25 milhões da Venezuela em um prazo de 12 meses e encontrou remessas feitas ao Brasil por meio de uma conta de uma estatal daquele país, ao investigar uma organização criminosa especializada em lavagem de dinheiro.
A conta está em nome da estatal de petróleo PDVSA (Petróleos de Venezuela), mas a PF ainda não recebeu informações oficiais do governo da Venezuela para saber se de fato a transação envolveu a companhia.
Em conversas telefônicas interceptadas pela PF, um dos doleiros presos na operação cita a conta em nome da estatal para atrair novos clientes e mostrar o poder de atuação do grupo.
Já foram detectadas contas abertas em duas instituições financeiras na Venezuela, uma delas é o banco Banesco.
"Com a grave crise que atravessa a Venezuela, há um movimento intenso para retirar dinheiro do país. São bilhões de bolívares que estão sendo enviados para fora", disse o delegado Alberto Ferreira Neto, da delegacia especializada a repressão a crimes financeiros e desvios de recursos públicos da PF.
"Existe uma variação cambial grande no país, e o grupo lucrava muito com essas operações, uma vez que cobrava comissões sobre as transações feitas", completou.
A Venezuela enfrenta inflação elevada, crise de desabastecimento e confrontos frequentes, o que tem levado, segundo a PF, empresários com negócios naquele país a procurarem a organização para remeter dinheiro para fora.
Os recursos saem de contas em nome de empresas da Venezuela, passeiam por diversas contas bancárias (conhecidas como contas de passagem) e são usados para fazer negócios de comércio exterior - alguns são fictícios outros envolvem mercadorias exportadas de forma superfaturada - com empresas situadas no Brasil que pertencem a essa organização criminosa.
Em parte de transações, o superfaturamento chegou a 5.000%. Entre as mercadorias exportadas identificadas nas negociações estão máquinas (como processadoras de camarão e máquinas de moer carne) e comércio de soja.
Durante as investigações, os policiais identificaram empresas exportadoras que nem existiam. "Muitas funcionavam em apenas uma salinha, no endereço da casa de um laranja e tinha atividade só em um site", afirmou o delegado.

A Operação Porto Victoria investiga crimes de evasão de divisas e lavagem de dinheiro

DO BRASIL PARA FORA
Outra parte do esquema investigado mostrou que, do Brasil, os recursos eram enviados para Hong Kong por meio de contratos de câmbio em transações que envolviam importações fictícias feitas por empresas da organização ou empréstimos.
"Uma empresa sediada no Brasil empresta para outra companhia em Hong Kong que também pertence ao grupo. Dessa forma, a conta naquele país é abastecida com recursos que podem, em seguida, ser repassados a outras contas em qualquer lugar do mundo. ", explica o delegado.
A compensação era feita de forma imediata, porque o dinheiro já estava disponível na conta de Hong Kong. O nome da operação foi dado em alusão ao Porto de Victoria, região turística desse país.
O grupo lucrava com a prestação de serviço, cobrando comissões entre 1% e 2% do valor total da transação feita. "Se existe a oferta de serviço de um lado, existe o cliente do outro. É isso que nos interessa saber agora: quem são os clientes que usaram o esquema", afirmou Ferreira Neto.
Foram localizadas até agora 30 empresas que atuaram nas transações, entre tradings, importadoras e exportadoras de áudio, vídeo e informática, de peças de transporte e até de comércio de sapatos, além de corretoras e adminisstradoras de ativos. Uma delas movimentou R$ 170 milhões, segundo as investigações.
O Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), vinculado ao Ministério da Fazenda, já identificou movimentações que resultam na lavagem de dinheiro da ordem de R$ 3 bilhões.

QUEM É QUEM
A ação envolveu 130 policiais que prenderam 12 pessoas e fizeram busca e apreensão em quatro cidades do Estado de São Paulo (capital, Araras, Inadaituba e Santa Bárbara D´Oeste), Resende (RJ) e Curitiba (PR).
Entre os presos estão o ex-vice presidente do Banco do Brasil Allan Simões Toledo, o ex-secretário municipal de Curitiba para a Copa, Luiz Carvalho, e os doleiros Abidão Bouchabki Neto e Marcos Glikas.
A reportagem não localizou os advogados dos suspeitos presos pela PF até a noite de quinta-feira (dia 11.jun.2015).
Entre os suspeitos, quatro doleiros que participam diretamente da remessa de dinheiro ao exterior tiveram prisão preventiva decretada.
Os outros oito suspeitos foram presos temporariamente; eles atuavam no mercado financeiro, facilitando a ação dos doleiros que operavam a remessa de recursos a cinco países sob investigação até agora: EUA, Venezuela, Brasil, Hong Kong e Reino Unido. A prisão temporária normalmente ocorre por um prazo de cinco dias, que pode ser prorrogado por mais cinco dias.
Um desses oito presos é um morador da periferia de São Paulo que emprestava seu nome a empresas da quadrilha. Parte dessas empresas era de fachada e fazia transações de comércio exterior fictícias para remeter dinheiro para fora sem passar por controle de órgãos como o Banco Central, segundo informou a PF.
Durante a ação foi apreendido cerca de R$ 1 milhão em espécie, entre euros e reais, carros de médio porte e 30 contas de empresas e dos envolvidos foram bloqueadas pela Justiça Federal. Os 12 presos tiveram seus bens sequestrados para dificultar a movimentação de dinheiro da quadrilha.

A quadrilha movimentou em torno de R$ 3 bilhões em evasão de divisas 
e lavagem de dinheiro em vários países

OS SUSPEITOS
Toledo comandou a área de negócios internacionais do BB de 2009 a 2011, quando foi desligado, após ser investigado pelo Coaf (órgão de inteligência do Ministério da Fazenda) por movimentação financeira atípica em sua conta e participar de uma tentativa de desestabilizar o então presidente do banco, Aldemir Bendine, para disputar seu cargo. Na ocasião, ele justificou que o dinheiro vinha da venda de um imóvel e o caso foi arquivado.
Atualmente, ele trabalha no banco Banif, que atua no mercado financeiro e internacional, é também é alvo da PF. Procurado, o banco informou que não iria se pronunciar.
Luiz Carvalho ocupou cargos entre 2005 e 2012 na área de turismo e relações institucionais em Curitiba, onde foi secretário da Copa.
Já o doleiro Marcos Glikas, também alvo da ação desta quinta, já esteve preso nos EUA e no Brasil, em 2004, após se envolver em extração ilegal de diamantes em reserva indígena em RO.
As investigações da PF começaram há nove meses após um pedido da agência norte-americana de imigração e alfândega da polícia dos EUA feito à PF para apurar o envolvimento de um brasileiro em um grupo que lavava dinheiro em ao menos cinco países.


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