segunda-feira, 13 de outubro de 2014


Por gratificação salarial, juízes federais param processos

Juízes federais de ao menos três Estados usaram suas decisões judiciais para pressionar o governo a lhes conceder um benefício salarial. Fazendo criticas à presidente Dilma Rousseff e dizendo receber menos que procuradores da República, os magistrados suspenderam a tramitação de processos e exigiram a regulamentação de um adicional para liberar o andamento de ações.
A reportagem teve acesso a dez decisões judiciais, proferidas por cinco juízes, em que eles explicitam a briga. Os magistrados dizem que a presidente Dilma fez cortes no orçamento do Judiciário e vetou o chamado "adicional por acúmulo de função", que é pago aos membros do Ministério Público Federal.
A ação dos magistrados é coordenada pela Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil). A entidade orientou filiados a deixarem de decidir processos que não fazem parte de seu acervo primário, ou seja, que pertenceriam a um juiz substituto que ainda não foi nomeado.
Com a orientação, parte dos magistrados parou de trabalhar com o "acervo extra".
Na quinta-feira (09.out.2014), uma juíza de Petrópolis escreveu num despacho que ela, ou "qualquer trabalhador", não é obrigado a atuar "sem retribuição adequada". Disse ainda que o trabalho forçado não é admitido no Brasil. Afirmou que "a união se enriquece ilicitamente" com seu trabalho há anos, pois ela "acumula acervos de forma graciosa, sem remuneração [extra]".
No Brasil, um juiz federal ganha R$ 25,2 mil de salário e outros R$ 4,3 mil na forma de auxílio-moradia.
As frases da juíza foram copiadas de outra decisão de um magistrado da Justiça Federal do Rio de Janeiro. Ao menos três juízes usam exatamente os mesmos termos para pressionar por aumento ou pela imediata nomeação de um juiz substituto para suas Varas.
Além do Rio, há decisões no Pará e no Acre, onde juízes citam expressamente a Ajufe para justificar a suspensão de processos. A reportagem também identificou ações paralisadas no Distrito Federal, mas, nos despachos, é dito somente que o presidente do Tribunal Regional Federal recebeu uma lista de juízes que não irão mais decidir casos que seriam de juízes substitutos.
O presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Marcus Vinícius Côelho, criticou a atuação dos juízes. "É como se um militar se negasse a acender um canhão dizendo que seu soldo é pequeno. Não se pode condicionar decisões da Justiça a reajustes salariais".
Questionado sobre o caso, o corregedor da Justiça Federal, ministro Humberto Martins, disse que irá atuar contra este tipo de paralisação. "Vou cobrar os corregedores regionais para que adotem providências quanto aos juízes. Não se pode condicionar o andamento de processos a gratificações ou auxílios."
O presidente da Ajufe, Antônio César Bochenek, disse que, mesmo nos processos de acervos extras, casos urgentes são decididos. "Não somos irresponsáveis e não queremos prejudicar o cidadão, mas também não podemos trabalhar sem contraprestação."
Ele ainda destacou que que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), em 2011, garantiu a simetria entre magistrados e o Ministério Público. Por isso, se há gratificação para procuradores também deveria haver para juízes federais.

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