Agricultores denunciam fraude envolvendo crédito do Pronaf no Rio Grande do Sul
Elvino Bohn Gass (PT) |
A Polícia Federal deve deflagrar nas próximas semanas uma operação
referente a um inquérito que apura supostas fraudes na concessão de
financiamentos via Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf) em
um esquema arquitetado a partir de Santa Cruz do Sul. Ao todo, 6 mil
agricultores na região teriam sido lesados nos últimos anos. A
investigação teve início em 2012, a partir de uma denúncia levada à
Delegacia da Polícia Federal de Santa Cruz. No início desta semana,
cerca de 60 agentes da PF chegaram a ser deslocados para Santa Cruz para
cumprir mandados de busca e apreensão, mas a operação foi desativada
por conta de uma determinação do Supremo Tribunal Federal. O STF, por
sua vez, agiu a partir de um pedido da Procuradoria-Geral da República,
que alegou que a PF já havia sido alertada de que só deveria cumprir os
mandados após o dia 6 de outubro - ou seja, após a eleição.
Embora capitaneadas de Santa Cruz, as fraudes possuíam ramificações em
vários municípios da região, incluindo Sinimbu, Vera Cruz, Venâncio
Aires e Passo do Sobrado. Os financiamentos eram intermediados pelo
Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). O vereador e coordenador do
MPA em Santa Cruz, Wilson Rabuske (PT) e o deputado federal Elvino Bohn
Gass (PT) estão entre os investigados. Os recursos desviados do Pronaf
teriam sido utilizados para custear campanhas eleitorais nos anos de
2008, 2010 e 2012.
A Polícia Federal alega que a investigação corre sob sigilo e, por isso, não comenta o caso.
Segundo agricultores, empréstimos eram transferidos para associação.
Associação tem mais de 5 mil agricultores associados no Vale do Rio Pardo.
O agricultor Claudio Muller e esposa - clique aqui e veja a reportagem |
Agricultores do Vale do Rio Pardo, no Rio Grande do Sul, dizem que foram
lesados pela entidade que representa a categoria na região. Eles
fizeram empréstimos do Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (Pronaf), mas em muitos casos o dinheiro foi parar
na conta da Associação Santa-Cruzense dos Agricultores Camponeses
(Aspac), integrante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA).
Segundo os produtores rurais prejudicados, os empréstimos solicitados
eram liberados pelo Banco do Brasil, mas a associação dizia para o
agricultor que o crédito não havia sido aprovado e transferia o dinheiro
para a própria conta. O MPA então convencia o produtor a encaminhar um
novo pedido. Quando o segundo financiamento era liberado, a vítima era
avisada que o dinheiro estava na conta. As transferências bancárias eram
feitas pelo MPA com o uso de uma procuração, assinada pelos
agricultores junto com os contratos do Pronaf.
A família de Claudio Muller só ficou sabendo do prejuízo de R$ 70 mil
quando o banco começou a cobrar a dívida, dois anos após o período de
carência. O agricultor, a mulher e a mãe dele estão com o nome sujo.
"Eu confiei no MPA, assinei em branco. Eles diziam que era um dinheiro
que tinha que pegar, que se não pegasse o governo retornava e não
mandaria mais para os 'colonos'", lembra o agricultor.
Os empréstimos eram feitos no nome de mais de um integrante da família,
com o mesmo objetivo de investimento, o que proibido. “Nós estamos
vivendo às custas do salário dos meus pais”, lamenta Muller.
Entretanto, em alguns casos os dois empréstimos foram desviados. Foi o
que aconteceu com o produtor rural Alfonso Vogt, que está pagando por um
dinheiro que nunca usou.
"O crédito de R$ 4 mil não veio. Aí dobraram para R$ 9 mil, e o valor
também não veio, ficou em outras contas. Não tenho a quem recorrer", diz
o produtor, que segue pagando o financiamento mesmo sem o dinheiro ter
ido para a sua conta.
A Aspac tem mais de 5 mil agricultores associados na Região do Vale do
Rio Pardo. O caso chegou a ser investigado pela Polícia Civil, mas como
envolve o desvio de recursos da União, foi encaminhado à Polícia
Federal, que ainda não se manifestou sobre o assunto.
O Banco do Brasil suspendeu o convênio com o MPA. Segundo a ata de
reunião com os diretores do movimento, em 2012 e 2013 a inadimplência
chegou a 50% nas duas agências. A direção do MPA informou ao banco que
sabia das irregularidades há um ano.
“Eu não fui agente de crédito rural, eu nunca tive essa função. A minha
função, desde que eu entrei no MPA, foi organizar os agricultores para
que eles possam melhorar de qualidade de vida. O crédito quem faz é o
banco, inclusive por outras instituições de fora do município”, declara o
coordenador do MPA de Santa Cruz do Sul, Wilson Rabuske, que também é
vereador no município pelo PT.
Em nota, o Banco do Brasil informou que iniciou apurações internas para
verificar reclamações relacionadas a operações do Pronaf em Santa Cruz
do Sul e Sinimbu. O presidente da Associação Santa-Cruzense de
Agricultores Camponeses, André Luís Sehnem, disse que não vai se
pronunciar sobre as denúncias e está há três meses no cargo.
Já o coordenador estadual do Movimento dos Pequenos Agricultores no Rio
Grande do Sul, Leandro Noronha, informou que está acompanhando o caso, e
que o coordenador de Santa Cruz do Sul nunca foi autorizado a
intermediar os créditos do Pronaf com o uso das contas do movimento. A
orientação é que o dinheiro seja creditado direto na conta dos
agricultores, como acontecem no restante do estado. A exceção, segundo
ele, ocorreu apenas nas agências de Santa Cruz do Sul e Sinimbu.
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