Escoceses vão às urnas sobre independência
No próximo dia 18 de setembro, os escoceses vão às urnas para decidir se
permanecem no Reino Unido - junto com Inglaterra, País de Gales e
Irlanda do Norte - ou se seguem o caminho da independência.
Ao longo de séculos de história, os escoceses lutaram ferrenhamente para
manter-se como nação soberana. A atual união política com a Inglaterra,
oficializada há 305 anos, ocorreu, em parte, em meio a uma séria crise
financeira.
As pesquisas, que antes apontavam uma vitória confortável do "não" à
separação, hoje sugerem uma disputa apertada. Entre os cinco milhões de
escoceses, os que argumentam pela independência dizem que a economia, as
políticas sociais e a criatividade escocesas floresceriam se o país
tivesse mais autonomia.
Para o campo oposto, a Escócia está mais segura fazendo parte do Reino
Unido. Muitos se contentariam com mais autonomia financeira e legal para
o Parlamento escocês - já o Legislativo com maior grau de "poderes
devolvidos" por Westminster à população local de Escócia, Irlanda do
Norte e País de Gales.
Dois debates acalorados entre o líder da campanha Better Together
(Melhor Juntos), Alistair Darling, e o líder do movimento nacionalista
escocês, Yes Scotland (Sim, Escócia), Alex Salmond, ainda não
persuadiram totalmente os indecisos.
Salmond, líder do Partido Nacional Escocês, governista, e chefe do
governo escocês, e Darling, representante do Partido Trabalhista
britânico, deixaram de lado as amenidades e partiram para a ofensiva na
tentativa de ganhar os eleitores.
Cinco pontos que os eleitores levarão em conta na hora de fazer sua escolha:
1. Moeda
A questão da moeda a ser adotada por uma Escócia independente tem
atraído atenção na campanha do referendo. Nos debates, Darling indicou
que caso a Escócia vote pela independência, não poderá manter a libra
esterlina como moeda nacional.
Salmond diz que é perfeitamente possível para a Escócia continuar usando
a libra, da mesma forma que outras nações usam o dólar sem a
necessidade de pedir permissão ao governo americano. Entretanto, o
descompasso entre as duas economias pode trazer consequências ruins para
o novo país.
Por exemplo, no caso de um aumento na taxa de juros, que seria decidida
apenas pelo Banco Central ao sul da fronteira, sem qualquer controle de
Edimburgo.
Se abrir mão da libra, a autoridade monetária escocesa teria de provar
aos investidores que tem competência para administrar sua própria moeda
sem sair imprimindo dinheiro quando o governo decidisse gastar mais. Até
que os mercados se convencessem disso, argumentam os céticos, a Escócia
teria de pagar juros mais altos sobre empréstimos.
A campanha do "não" também alerta para a possibilidade de algumas
empresas britânicas deixarem a Escócia. A Inglaterra continuaria sendo o
maior parceiro econômico de uma Escócia independente; no entanto,
variações na taxa de câmbio entre a libra e a nova moeda escocesa
poderiam elevar os custos para as empresas, criando incentivos para que
se mudassem.
O desejo de pertencer a um mercado maior (o inglês) ou, no caso de
empresas do setor financeiro, de fazer parte do principal centro
financeiro da Europa - Londres -, também poderia levar empresas a cruzar
a fronteira.
Essas questões são consideradas por Salmond como uma forma de intimidar o
povo escocês. Ele acredita que uma união monetária por meio da libra
pode ser negociada entre as duas partes. Caso contrário, argumenta, a
Escócia teria direito a recusar responsabilidade sobre uma fração da
dívida britânica.
A Escócia poderia ainda adotar o euro, a moeda da União Europeia, mas o
governo escocês já disse que não é favorável a essa opção.
2. Petróleo
As reservas de gás e petróleo do Mar do Norte são outro tema quentíssimo nesse referendo.
Salmond diz que uma Escócia independente reservaria um décimo da renda
do petróleo - que a ala Yes Scotland calcula ser equivalente a £1
bilhão, ou US$ 1,6 bilhão - para criar um fundo de reserva que
acumularia, em uma geração, £30 bilhões, quase US$ 50 bilhões.
O primeiro-ministro britânico, David Cameron, diz que a exploração do
petróleo no Mar do Norte tem sido uma história de sucesso para a
Grã-Bretanha. Mas nesse momento, em que a extração vai se tornando mais
difícil, é importante que a indústria do petróleo possa se apoiar nos
"ombros largos" do Reino Unido, argumenta.
Parte do problema é que as reservas de petróleo não são renováveis, e
não há consenso, entre especialistas, em relação à quantidade de
petróleo que ainda resta na região.
O governo britânico prevê que os impostos arrecadados com o petróleo vão
cair de £6 bilhões em 2012-13 para £3,5 bilhões em 2018-19.
O governo escocês calcula que mais de 90% dos £6 bilhões arrecadados
vieram de águas escocesas. As previsões de renda do "setor escocês" em
2018-19 variam entre £3,2 bilhões e £8 bilhões.
Previsões desse tipo são complicadas. Elas levam em conta a quantidade
extraída de petróleo e gás, os preços globais, índices de impostos e
flutuações na taxa de câmbio entre a libra e o dólar.
Alguns especialistas creem que os números escoceses estejam
superestimados em até 60%. Outros, que os ganhos escoceses futuros podem
ser seis vezes maiores do que os britânicos estimam. A dúvida não
facilita uma decisão por parte do eleitorado.
3. Fronteiras
Declarações de que a fronteira entre os dois países teria de ser
controlada caso a Escócia se tornasse independente também têm gerado
discussões.
A polêmica resulta das posições de Salmond em relação à imigração. Ele
espera aumentar a entrada de imigrantes na Escócia em 10% - de 22 mil
para 24 mil pessoas por ano - para expandir a força de trabalho e, dessa
forma, contribuir para financiar a aposentadoria dos escoceses.
O chefe do governo escocês argumenta que uma Escócia independente não
precisaria de postos de controle na fronteira, já que o país continuaria
a integrar a área de transito livre de que fazem parte o restante do
Reino Unido, a República da Irlanda, a Ilha de Man e as ilhas no Canal
da Mancha.
Atualmente, Reino Unido e República da Irlanda não fazem parte do
chamado acordo de Schengen, que permite trânsito livre, sem passaporte,
entre vários países europeus.
A ministra do Interior britânica, Theresa May, disse considerar a
possibilidade de "algum tipo de controle de fronteira". Ed Miliband,
líder do Partido Trabalhista, disse que um governo trabalhista também
consideraria a criação de postos na fronteira se a Escócia optasse pela
independência.
A preocupação é que as regras de imigração em cada lado da fronteira
sejam diferentes, servindo de incentivo para imigrantes ilegais
desembarcarem na Escócia e para então se deslocarem para a Inglaterra.
Além disso, existe a questão da entrada ou não da Escócia na União
Europeia. Analistas acreditam que o novo país muito provavelmente teria
de solicitar sua entrada na União Europeia, em cujo caso talvez fosse
obrigada a assinar o acordo de Schengen.
Se isto acontecer, Escócia e o país ao sul da fronteira teriam regras
migratórias diferentes, implicando a necessidade de algum tipo de
controle fronteiriço.
Entre as questões que mais preocupam os eleitores britânicos, a
imigração só perde em importância para o tópico economia, segundo
pesquisas de opinião.
4. A União Europeia
A questão da entrada na UE não se refere apenas às regras migratórias. A
dúvida é se uma Escócia independente teria de negociar sua participação
no bloco como país integrante ou partindo do zero, como país novato.
Para o Yes Scotland, a negociação se daria pela continuidade do status
atual; a ala Better Together diz que a Escócia teria de sair da EU e
depois requisitar admissão, o que levaria anos.
O atual presidente da Comissão Europeia, o português José Manuel
Barroso, diz que seria dificílimo para a Escócia ser admitida na UE. Mas
intelectuais como a acadêmica da Universidade de Oxford Sionaidh
Douglas-Scott creem que o processo seria relativamente simples.
Para o Reino Unido, a questão é importante porque influenciaria as suas
relações com o novo país em áreas como direitos humanos e comércio
exterior.
5. Defesa nuclear
Outro tema controverso é o sistema britânico de defesa nuclear -
atualmente composto de quatro submarinos carregados com os mísseis
Trident. O programa está instalado na Base Naval de Clyde, na costa
oeste da Escócia, desde a década de 1960.
O governo britânico diz que não tem planos de transferir o sistema caso a Escócia vote pela independência.
Tanto os partidos Conservador quanto Trabalhista britânicos querem que o
sistema atual seja substituído por outro, igual, no final da década de
2020. Liberal Democratas querem diminuir o número de submarinos para
três.
No entanto, o governo escocês diz que, se a Escócia votar "sim", o
programa Trident será removido quando as armas forem recolhidas, em
2020. Salmond propõe incluir em uma Constituição a proibição à
instalação de armas nucleares no país.
Alguns analistas acreditam que a independência da Escócia equivaleria a uma "declaração unilateral de desarmamento" britânica.
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