Grampo da PF revela "flexibilidade" em composição do "tribunal" da Receita
Integrante do Conselho de Recursos
Fiscais conversa sobre troca de nomes em turma; para investigadores da
Operação Zelotes, ligação mostra ‘influência’ de terceiros no colegiado.
Um grampo da Operação Zelotes no telefone do ex-conselheiro do Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) Jorge Celso Freire da Silva
indicou que é “flexível” a composição das Turmas de Julgamento do órgão
responsável por analisar reclamações de contribuintes em débito com a
Receita. Segundo a Polícia Federal, uma das ligações interceptadas
demonstra a ‘flexibilidade’ que possui um Presidente de Câmara e “a
‘influência’ que aceita no cumprimento dessa tarefa”.
OUÇA O ÁUDIO GRAMPEADO PELA PF:
O Ministério da Fazenda, ao qual está vinculado o CARF, informou que o
Presidente de Câmara “não tem total liberdade” para compor as Turmas de
Julgamento. As Turmas, segundo a Pasta, são compostas à medida que
surgem as vagas, “por indicação por parte das Confederações ou da
Receita Federal”.
A Zelotes, deflagrada há duas semanas pela PF, identificou um
superesquema de fraudes no CARF que teria beneficiado grandes empresas e
bancos. Estima-se que pelo menos R$ 19 bilhões foram desviados dos
cofres públicos.
O Conselho é vinculado ao Ministério da Fazenda. Para a PF, a
organização criminosa influenciava e corrompia funcionários públicos,
conselheiros e servidores para cancelar ou reduzir valores de infrações
nos julgamentos de recursos dirigidos ao tribunal administrativo,
através da “conquista” dos votos de seus conselheiros.
“Vou perguntar um negócio. O Leonardo pediu para não colocar o
Frederico, tá certo? Deixa eu ver aqui o nome dela. Acho que é Carmem,
presidente. Mas ela mandou um e-mail se prontificando a ajudar. Pode
colocar ela no lugar do Frederico?”, pergunta a Jorge Celso um homem
ainda não identificado pela PF.
“Pode, pode. Você coloca a posição, para a gente não discriminar. [...]
Se você quiser, a gente bota para compor. Eu não sei nem se ele é da
turma especial, porque ela está botando processo, né? Para ficar bem
democrático. Se ela quiser, tudo bem. Se não, tudo bem”, responde o
ex-conselheiro em ligação interceptada em 31 de outubro de 2014.
A conversa dura pouco mais de dois minutos.
“Tá bom, ela (Carmem) mandou um e-mail aqui para mim dizendo que se prontificava a ajudar”, prossegue o interlocutor.
“Você diz assim: olhe, nós combinamos assim. Agora, dependendo do seu
grau de satisfação, dependendo do seu grau de trabalho aí, como é que
está. Para nós é bom, entretanto, estaria facultado. Faz aquela
algaroba, querendo e não querendo, né?”, ensina o ex-conselheiro.
“Entendi, entendi, tá legal”, responde o interlocutor.
Para a PF, as fraudes resultaram em bilhões de reais “economizados”
pelas empresas autuadas, em detrimento do erário da União. Sobre essa
economia teriam incidido porcentualmente as “comissões”, sob a “cláusula
de sucesso”, ou seja, um porcentual que levaria em consideração o que
os cofres públicos deixariam de recolher.
Um dos principais articuladores, segundo a Polícia Federal, seria José
Ricardo da Silva, advogado e sócio de empresas que formariam uma
organização criminosa comandada por ele. José Ricardo teria atuado em
favor das empresas dentro do conselho mediante recebimento de propinas,
afirmam os investigadores.
A PF o acusa de integrar o esquema de corrupção no colegiado, usando
suas empresas, e chegou a pedir a prisão dele. A Justiça, no entanto,
não considerou a medida necessária. Jorge Celso Freire da Silva não foi
localizado para comentar as suspeitas da Polícia Federal.
COM A PALAVRA, O CARF.
Em nota divulgada na segunda-feira, 06.abr.2015, o Conselho informou que
desvios éticos e atos de improbidade ou de corrupção são fatos isolados
e que está implementando ações de melhoria da gestão, adotando
procedimentos que confiram maior segurança, transparência e celeridade
aos julgamentos.
“Em sua trajetória ao longo destes anos, o quadro de Conselheiros e
Servidores do CARF sempre esteve formado por pessoas dedicadas,
comprometidas e integras, assim como os demais servidores que atuam das
organizações públicas e privadas. Desvios éticos, atos de improbidade ou
de corrupção são fatos isolados, atribuíveis às pessoas que os tenham
realizado ou praticado, independentemente das instituições. Sua eventual
ocorrência não pode ser, indiscriminadamente, associada ao corpo
técnico e funcional das instituições públicas ou privadas. Os fatos
narrados no contexto da Operação Zelotes constituem desvio ético
altamente condenável, sobretudo pelos prejuízos aos cofres públicos e à
imagem do CARF, de seus Servidores e Conselheiros. Referidos fatos devem
ser apurados com rigor, identificadas as infrações cometidas e punidos
os responsáveis, na forma da Lei. Por essa razão, o CARF apoia as
investigações e todas as medidas saneadoras necessárias.”
COM A PALAVRA, O MINISTÉRIO DA FAZENDA.
O Ministério da Fazendo afirmou que Jorge Celso Freire da Silva não é
mais Presidente de Câmara. Segundo o órgão do governo, ele ficou no Carf
durante 3 anos, e saiu em 2014.
“O Presidente de Câmara não tem total liberdade para compor as Turmas de
Julgamento. As TJ são compostas à medida que surgem as vagas, por
indicação por parte das Confederações ou da Receita Federal, conforme a
vaga seja de representante dos Contribuintes ou da Fazenda Nacional. As
indicações ocorrem por encaminhamento de lista tríplice e os indicados
devem atender os requisitos de tempo e experiência na matéria
tributária/contábil/processual exigidos. A escolha do conselheiro dentre
os candidatos é feita pelo Comitê de Seleção de Conselheiro, na forma
do arts. 32, 33 e seguintes do Regimento Interno do CARF aprovado pela
Portaria MF n. 256, de 22 de junho de 2009. Após a escolha do nome do
Conselheiro o Comitê submete à consideração do Ministro da Fazenda para
designação.”
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