Dúvida sobre ajuste fiscal não dá folga à política de juros
Se ainda estivéssemos entre fins de janeiro e logo depois do carnaval,
em meados de fevereiro, a decisão de ontem do Comitê de Política
Monetária (Copom) até poderia ser encarada com alguma surpresa. Naquele
tempo, os analistas estavam mais divididos entre uma alta de 0,25 ponto
porcentual ou de 0,5 ponto, em março. Mas, com números e projeções
econômicas cada vez piores e uma escalada nas turbulências políticas, a
alta de 0,5 ponto na taxa básica de juros já era a aposta preferencial
há alguns dias.
Com a opção pelo ajuste fiscal, adotada pela presidente Dilma Rousseff
no início do seu segundo mandato, imaginou-se que, apesar da necessidade
de um forte desrepresamento de preços, o que traria inevitáveis
pressões inflacionárias, a política monetária poderia ser menos exigida.
Mas as dúvidas em relação à capacidade de o governo entregar o
superávit primário prometido - seja por uma suposta falta de convicção
da presidente com os benefícios da austeridade, seja por resistências
políticas da própria base aliada no Congresso - nunca deixaram de estar
presentes.
Assim, aos poucos, a ideia de que o Banco Central poderia encerrar o
atual e já longo ciclo de alta da taxa Selic com uma última elevação de
0,25 ponto em março foi ficando para trás. Mesmo com a trajetória da
economia apontando para um período de recessão mais fundo e mais longo,
os juros, na avaliação da maioria, ainda teriam de operar, como a
política fiscal, na direção contracionista.
A escalada da taxa de câmbio, que bate em R$ 3 por dólar e registra uma
desvalorização de quase 10% desde o início do ano, também contribuiu
para fazer as apostas dos analistas convergirem para a alta afinal
definida pelo Copom. Diante das pressões inflacionárias existentes, que
jogam todas as projeções da taxa acumulada em 12 meses, ao longo do ano,
para cima do teto da meta de inflação, um maior aperto nos juros era
praticamente inevitável, ainda que a retração da economia possa reduzir o
ritmo e o grau de contaminação dos preços.
Depois da decisão de ontem, um grupo considerável de analistas passou a
considerar que o término do atual ciclo se estenderá até fins de abril,
com uma elevação de 0,25 ponto e a taxa básica estacionada em 13% ao
ano.
Os mais crentes no êxito do ajuste fiscal estão prevendo que os juros
poderão recuar, em 2016, para 12% ao ano. Alguma devolução desse tipo
também poderá ganhar espaço se o nível de contração da atividade
econômica for fundo demais.
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