segunda-feira, 29 de setembro de 2014


"Essa história de caixa dois não existe no Brasil", diz o presidente do TSE
Dias Toffoli argumenta que no Brasil "o caixa 1 contempla tudo, porque você não tem limite de gastos"

O homem que comanda a disputa nas urnas de 2014 é categórico ao negar a existência de caixa 2 nas campanhas políticas no Brasil. Para o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro José Antonio Dias Toffoli, trata-se de um "não assunto". Sem limitação estabelecida de gastos para as campanhas, a contabilidade oficial de candidatos e partidos comporta todas as despesas, afirma o ministro.
Aos 46 anos, Toffoli conhece as entranhas da política. Natural de Marília (SP), formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), foi assessor jurídico da liderança do PT na Câmara, advogado do partido em campanhas presidenciais, subordinado de José Dirceu na Casa Civil e Advogado-Geral da União (AGU) no governo Lula.
A relação com a sigla e o ex-presidente valeu a indicação feita por Lula para o Supremo Tribunal Federal (STF). Toffoli tomou posse em 2009, aos 41 anos. Ignorou a pressão para se declarar impedido e julgou o processo do mensalão, no qual o ex-chefe José Dirceu era réu. Em maio passado, ao assumir o TSE, garantiu desprendimento do passado:
– É página virada.


O Supremo Tribunal Federal deve decidir sobre o financiamento de campanha público ou privado?
Quando provocado, é. Todos que foram eleitos receberam dinheiro de empresas na campanha. O julgamento das doações de empresas já foi um início maduro de discussão. Na França, o limite de doação de pessoa física é de 4,6 mil euros (cerca de R$ 14,2 mil), nos EUA, de US$ 2,6 mil (R$ 6,2 mil). No Brasil, o cidadão pode doar até 10% da sua renda conforme o imposto de renda. Aqui, você não tem uma igualdade como há em outros países. Uma pessoa que teve uma renda de R$ 100 milhões, e existem no Brasil pessoas com essa renda, pode doar R$ 10 milhões. Já quem recebe um salário mínimo (R$ 724) doa pouco.

O senhor é a favor do financiamento público?
Exclusivo, não. O cidadão tem o direito de contribuir para sua campanha como contribui para sua igreja, seu clube. Agora, tem de haver limite para ter igualdade, para que os que têm muito dinheiro não extrapolem sua influência nas eleições. Limite de doação e limite de gastos são importantes.

O limite de gastos é um tema que não anda no Congresso.
Nos EUA, uma candidatura à Presidência teria direito a receber de financiamento público, mais ou menos, cerca de US$ 95 milhões (em torno de R$ 228 milhões). Ainda é menos do que as principais candidaturas declaram no Brasil. Na França, o limite do primeiro turno é de 15 milhões de euros (R$ 46 milhões) e, no segundo turno, de 20 milhões de euros (R$ 61,4 milhões).

E o caixa 2, ministro? A fiscalização e a Justiça Eleitoral conseguem barrar essa prática nas campanhas?
Temos condições de coibir o caixa 2, o problema é que no Brasil o caixa 1 contempla tudo, porque você não tem limite de gastos. No Brasil, você não precisa de caixa 2. O partido chega e fala que vai gastar R$ 400 milhões na campanha para presidente da República. Alguém precisa de caixa 2 no Brasil?

Então, por que os partidos e candidatos fazem caixa 2?
Na campanha para presidente da República, acho que não fazem. Falo com sinceridade, não fazem. Caixa 2 só se justifica quando há limite de gastos, e aí você quer escamotear o limite. Essa história de caixa 2 não existe no Brasil.

Mas e o recurso não declarado, que aparece em investigações e escândalos?
Alguém consegue gastar mais de R$ 400 milhões em uma campanha presidencial? O caixa 1 contempla tudo no Brasil. Nós temos de parar de agir com essas metáforas e mitos, e enfrentar a realidade. Nas campanhas, não há que se falar em caixa 2, porque no Brasil não há limite de gastos. Se tivesse, poderia se falar em caixa 2. A gente fica discutindo um não assunto.

Mas não é o caixa 2 que financia a corrupção?
É outra coisa. Se você tem a possibilidade de pessoa jurídica financiar campanha, você pode dizer que se cria um compromisso entre o financiador e o financiado. Nos EUA, em 1907, isso foi proibido. Em 1947, com o surgimento do sindicalismo, então se introduziu a proibição dos sindicatos contribuírem para as campanhas. Esse debate não é exclusivo do Brasil.

As empresas deveriam doar para as campanhas?
Uma coisa é falar de caixa 2, que acho que não tem nas disputas eleitorais, pois é o próprio candidato que define o seu limite de gastos. As doações são outra discussão. Pessoa jurídica vota? Se pessoa jurídica não vota, por que ela contribui? A questão não é falar em financiamento de candidatura ou de partido. Quem financia a democracia? No Brasil, é o grande capital. Isso é bom para democracia brasileira? Não. No mundo ocidental, tem se mostrado uma corrupção da vontade popular.

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