Congresso Nacional
Eleição do Senado vira briga de pátio de colégio
Eleição do Senado vira briga de pátio de colégio
Após deputados e senadores eleitos tomarem posse na sexta-feira,
1º.fev.2019, em Brasília, Câmara e Senado fizeram sessões para definirem
suas mesas executivas.
Os deputados reelegeram Rodrigo Maia (DEM) como presidente, mas no
Senado, a sessão foi suspensa após tumulto e discussões entre os
parlamentares, que discordavam sobre voto aberto e sobre Davi Alcolumbre
(DEM) atuar como presidente em exercício da casa.
Na manhã de sábado (02.fev.2019), o presidente do Supremo Tribunal
Federal (STF), ministro Dias Toffoli, decidiu atender ao pedido
formulado pelo Solidariedade e pelo MDB e determinar que seja secreta a
votação que vai definir o novo presidente do Senado, como prevê o
Regimento Interno.
A decisão monocrática do presidente do STF, Dias
Toffoli, de anular a decisão que aprovou uma votação aberta para a
presidência da Casa, foi vista com preocupação. Para senadores, Toffoli
interferiu indevidamente no Senado mesmo havendo entendimentos
anteriores de que ingerências sobre assuntos internos de outro poder não
poderiam ocorrer.
A disputa no Senado se dá principalmente entre o senador Renan Calheiros
(MDB-AL), que já presidiu a Casa por quatro vezes, e Davi Alcolumbre (DEM-AP). |
Normalmente, eleições para a presidência do Senado são monótonas.
Quem liga na TV Senado por descuido não consegue desligar. Dorme.
A disputa que foi ao ar na sexta-feira (1º.fev.2019), porém,
resultou numa animada programação. A julgar pelas cotoveladas
trocadas longe das câmeras, Renan Calheiros e seus adversários
protagonizaram no plenário uma briga típica de pátio de colégio.
Ao final, pode acontecer tudo. Inclusive nada.
Redigiu-se na noite de quinta-feira (31.jan.2019), um edital que
deu início a um curto-circuito num ambiente que já estava
eletrificado. Assinou o documento o servidor Luiz Fernando
Bandeira de Melo Filho, secretário-geral do Senado. Ele mantém com
Renan um relacionamento do tipo unha e cutícula. A pretexto de
estipular um roteiro para a disputa, Bandeira anotou que a sessão
seria presidida pelo senador mais velho. Chama-se José Maranhão
(MDB-PB).
Aliado de Renan, Maranhão já combinara que mandaria ao arquivo
qualquer manobra contrária aos interesses do cacique alagoano. Por
exemplo: requerimento para que o voto dos senadores seja aberto,
não secreto.
Ao chegar ao Senado, na manhã de sexta-feira (1º.fev.2019), o
senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), último remanescente da Mesa
Diretora da legislatura anterior, surpreendeu-se com o ato
rubricado pelo doutor Bandeira. Alcolumbre achava que é ele quem
deveria presidir a eleição do Senado, não José Maranhão. Por isso,
tomou três providências:
- 1) Como terceiro-suplente da Mesa que comandou os trabalhos na legislatura que se encerra, Alcolumbre assumiu interinamente a presidência do Senado. O posto está vago, pois Eunício Oliveira (MDB-CE), que ocupava a poltrona, não foi reeleito.
- 2) Na condição de presidente interino do Senado, Alcolumbre revogou o edital rubricado por Bandeira.
- 3) Na sequência, o interino exonerou o servidor pró-Renan do posto de secretário-geral do Senado.
Nos subterrâneos, Renan e seus aliados chamam Alcolumbre de "Juan
Guaidó" do Senado, numa referência ao autoproclamado presidente
interino da Venezuela. Sustentam que, como terceiro suplente, ele
não poderia assumir a presidência. Afirmam, de resto, que
Alcolumbre não tem isenção para comandar a eleição interna do
Senado, pois ostenta a condição de candidato a presidente da Casa.
De fato, Alcolumbre disputa a mesma poltrona que Renan cobiça pela
quinta vez. Dispõe do apoio do ministro Onyx Lorenzoni (Casa
Civl), seu companheiro de DEM. Dá de ombros para os ataques de
Renan. E não abre mão de presidir a sessão. Mais: alardeia nos
bastidores que providenciará para que a escolha do novo presidente
do Senado seja feita em votação aberta.
Para Renan e sua tropa, o voto aberto seria "um golpe", já que o
regimento interno do Senado prevê voto secreto. Os rivais de Renan
levaram ao plenário um abaixo-assinado pró-transparência.
Afirmaram que estava rubricado pela maioria dos senadores.
A confirmação da adesão em massa à tese do voto escancarado seria
uma péssima notícia para Renan. Os próprios aliados do senador
avaliam que, com o nome exposto no painel eletrônico, muitos
senadores podem fugir da companhia tóxica, desembarcando de sua
candidatura. Daí a perspectiva de que Renan e sua tropa levem a
briga pelo comando da sessão e pela manutenção do voto secreto às
últimas consequências.
Aliada de Renan, Kátia Abreu retira de Davi a pasta com o roteiro da sessão, forçando a interrupção |
A sessão tumultuada deslizou noite adentro, o Senado decidiu que a
escolha do seu próximo presidente seria feita por meio de voto aberto.
Por 50 votos a 2, os senadores modificaram o regimento interno da Casa,
que prevê votação secreta.
Irritado, Renan Calheiros (MDB-AL) desentendeu-se com o desafeto
Tasso Jereissati (PSDB-CE). As câmeras da TV Senado captaram a cena. Mas
as vozes soaram longe do microfone. Uma testemunha reproduziu o
teor da diálogo:
- Renan: "Toda essa confusão está acontecendo por sua causa, seu merda."
- Tasso: "Você é um ladrão."
- Renan: "Eu vou te pegar."
- Tasso: "Quem vai te pegar é a polícia. Você vai ser preso."
A turma do 'deixa-disso' interveio, para evitar que Renan e Tasso se
atracassem. A essa altura, a proclamação do resultado da votação que
instituiu o voto aberto incendiara o plenário. O tumulto estava
previsto. As manobras que pavimentaram a controvérsia começaram na noite
da véspera.
Sob impasse, o presidente interino Davi Alcolumbre suspendeu a sessão.
Remarcou a eleição do novo presidente do Senado para sábado
(02.fev.2019).
Renan Calheiros (MDB-AL) desentendeu-se com o desafeto Tasso Jereissati (PSDB-CE) |
Recomenda-se separar a cerveja e a pipoca. A programação pode ser
mais animada do que a novela, com barracos que nenhum BBB seria capaz de
prover.
Renan Calheiros (MDB-AL) presidiu o Senado quatro vezes. Numa, foi
alçado ao posto como candidato único. Não havia quem o desafiasse.
Noutras três, prevaleceu sobre rivais de reconhecida densidade política.
Hoje, Renan molha o paletó num embate contra um certo Davi Alcolumbre
(DEM-AP) que, até a semana passada, transitava pelos corredores do
Senado como um inexpressivo terceiro suplente da Mesa Diretora. Às
voltas com o risco de derrota, Renan e seu grupo forçaram o adiamento do
embate para sábado (02.fev.2019). E pediram socorro ao Supremo Tribunal
Federal.
Renan tornou-se um gigante subitamente minoritário. Na noite de
sexta-feira (1º.fev.2019), em sessão presidida por Davi, o eleitorado
potencial do ex-golias de Alagoas foi reduzido a 30 votos num colégio de
81 senadores. O tamanho de Renan foi medido em votação prévia, na qual
estava em jogo o tipo de voto a ser utilizado na disputa pelo comando do
Senado: secreto ou aberto? O breu favorece Renan. A transparência
afugenta parte dos seus eleitores, receosos do vínculo com a imagem
radioativa do candidato.
Sob protestos do grupo pró-Renan, a proposta de voto aberto foi
aprovada por 50 senadores. Ficou entendido que apenas 30 colegas se
dispõem a expor a cara no painel eletrônico para prestigiar a quinta
candidatura de Renan à presidência do Senado. Descontado o seu próprio
voto, o ex-gigante precisaria de pelo menos mais dez aliados para
atingir a marca de 41 votos, quantidade mínima necessária para vencer.
Os votos que faltam só virão se for restabelecida a escuridão, admitem
os aliados de Renan. Daí o tumulto produzido na sessão e o recurso
protocolado no Supremo na calada da noite.
Em tese, mantida a transparência, um adversário de Renan teria um
potencial de 50 votos numa disputa mano a mano. Como pelo menos sete
senadores exibem a disposição de medir forças com Renan, essas cinco
dezenas e votos seriam pulverizadas. E a disputa escorregaria para um
segundo turno. Pela lógica do voto aberto, Renan iria para esse round
como candidato favorito a fazer do seu rival o próximo presidente do
Senado.
Escorando-se no apoio do ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil), seu
companheiro de DEM, Davi Alcolumbre tenta consolidar-se como principal
adversário do ex-golias. Desafeto de Renan, Tasso Jereissati (PSDB-CE)
retirou-se da disputa para que a bancada tucana — ou a maior parte dela —
possa votar em Davi já no primeiro turno.
Renan jamais experimentou semelhante sufoco. Em 2005, sem adversários,
ele foi alçado à presidência do Senado com 72 votos dos 81 disponíveis.
Em 2007, foi reeleito com 51 votos, contra 28 atribuídos ao adversário
da época, José Agripino Maia (DEM-RN). Em 2013, Renan bateu Pedro Taques
(PSDB-MT) por 54 votos contra 18. Em 2015, no seu pior desempenho,
Renan foi reeleito com 49 votos, contra 31 amealhados por Luiz Henrique
da Silveira (MDB-SC). Em todas essas eleições o voto foi secreto. Renan
conseguiu que o presidente do Supremo, seu amigo Dias Toffoli, apagasse a
luz do painel eletrônico do Senado neste sábado (02.fev.2019), até o
horário previsto para a retomada da disputa.
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