Segundo Monica Moura, mulher do marqueteiro João Santana, Palocci intermediava ‘caixa 2’ e seria o ‘italiano’ mencionado em tabela de propina da Odebrecht
O ex-ministro Antonio Palocci |
O ex-ministro Guido Mantega não foi o único integrante de alta cúpula do
PT a intermediar pagamento de caixa dois para campanhas presidenciais
do partido, segundo Monica Moura, mulher do marqueteiro João Santana. Em
depoimento a procuradores federais de Brasília para tentar fechar um
acordo de delação premiada, ela disse que o ex-ministro da Fazenda e Casa Civil
Antonio Palocci e o ex-tesoureiro petista João Vaccari Neto teriam
desempenhado o mesmo papel nas últimas campanhas presidenciais. Os dois
teriam indicado a ela executivos de empresas para contribuir em
dinheiro. São recursos que não passaram por contas oficiais do PT, sem
serem declarados à Justiça Eleitoral.
As empresas do casal Santana prestaram serviços na campanha à reeleição
de Lula, em 2006, e nas disputas vencidas por Dilma Rousseff, em 2010 e
2014. Nas três eleições, eles receberam, em contas oficiais, cerca de R$
110 milhões. Monica diz ter registrado numa agenda, não apreendida pela
PF, detalhes de encontros em hotéis e restaurantes para obter recursos
adicionais, entregues em malas de dinheiro por interlocutores de
executivos indicados pelos três petistas.
TABELA — A mulher de Santana também diz ser capaz de ajudar a PF a
esclarecer informações da planilha nomeada “posição-italiano”,
apreendida na caixa de e-mail do então diretor da Odebrecht Fernando
Migliaccio. O italiano citado como referência para os pagamentos da
tabela seria Antonio Palocci. O documento é considerado um prova
contundente sobre o pagamento de propina a agentes políticos pela
empreiteira. Migliaccio era lotado no Setor de Operações Estruturadas da
Odebrecht, área responsável por operacionalizar repasses ilegais no
Brasil e no exterior.
A tabela traz a indicação de fontes para pagamentos e siglas de
destinatários, como o casal Santana e o ex-ministro da Casa Civil José
Dirceu. Em depoimento prestado logo após ser presa, em fevereiro, Monica
foi perguntada se sabia dizer quem era o “italiano”; na época, disse
que não.
A relação de proximidade com Migliaccio, o autor da tabela, já era
admitida por Monica neste mesmo depoimento. Na ocasião, reconheceu ter
sido orientada a procurar Migliaccio para receber colaborações não
contabilizadas de campanhas feitas no exterior. E confirmou ter mantido
contato com ele entre 2011 e 2014. Em março, a ex-secretária da
Odebrecht Maria Lúcia Guimarães Tavares reforçou o vínculo do dirigente
da empreiteira com Monica. Segundo ela, a mulher de Santana indicava a
ele e a outros dirigentes suas contas para receber pagamentos ilegais.
A tabela traz um balanço de como foram repassados, entre 2008 e 2012,
cerca de R$ 200 milhões a projetos como as eleições municipais de 2008, a
disputa presidencial em El Salvador e valores pagos a JD, que a PF
acredita ser Dirceu, e Santana. A planilha termina indicando haver, em
2012, um saldo de R$ 79 milhões. A curto prazo, R$ 6 milhões estariam
comprometidos com “Itália” e R$ 23 milhões com o “amigo”, não
identificado na tabela. Os demais R$ 50 milhões iriam para o
“pós-Itália”.
PALOCCI — Em nota à reportagem, Palocci nega “com veemência” as
acusações “feitas contra ele por uma pessoa submetida ao constrangimento
da prisão”. O ex-ministro afirmou não ter participado da arrecadação de
campanhas em 2006, 2010 ou 2014 e “jamais” ter indicado “a qualquer
pessoa meios pelos quais pudessem ser arrecadadas contribuições
ilegais”.
Palocci disse que não tem “qualquer relação com a tabela” de Migliaccio.
Segundo a nota, o petista “vê com muita estranheza que seja atribuído a
si o codinome ‘italiano’, já que este apelido foi vinculado a várias
outras pessoas em materiais apreendidos pela PF”. O ex-presidente da
Odebrecht Marcelo Odebrecht também cita um “italiano” em e-mails a
executivos, mas não é possível saber se é o mesmo citado por Migliaccio.
Palocci já é investigado na Lava-Jato desde junho de 2015, em inquérito
que apura denúncia de que ele teria pedido ao ex-diretor da Petrobras
Paulo Roberto Costa R$ 2 milhões para a campanha de Dilma, em 2010. Seu
nome foi citado pelo doleiro Alberto Youssef e pelo operador Fernando
Baiano. Este mês, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou pedido da
defesa de Palocci para anular as duas delações.
Vaccari também negou a acusação.
DE VOLTA — O relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, o
ministro Teori Zavascki decidiu devolver ao juiz federal Sergio Moro, em
Curitiba, as investigações relacionadas à Operação Acarajé — cujo alvo
principal foi o marqueteiro João Santana, que encabeçou campanhas de
Lula e Dilma, e a mulher dele, Monica Moura — e à Operação Xepa,
derivada da anterior. Moro havia submetido as apurações ao Supremo.
Teori, ao determinar a remessa das investigações de volta a Moro,
considerou que todos os atos do juiz nas referidas apurações foram
legais e dentro da prerrogativa que cabe à Justiça Federal. O ministro
não modificou ou fez qualquer reparo a nenhuma prisão ou outras
determinações de Moro no âmbito das operações Acarajé ou Xepa. Ficaram
mantidas, portanto, a prisão de João Santana e Monica Moura, detidos
desde o fim de fevereiro.
O casal se entregou à Polícia Federal ao aterrissar em Guarulhos (SP)
vindo da República Dominicana, onde Santana trabalhava na campanha de
reeleição de Danilo Medina, do Partido de Libertação Dominicana (PLD).
A defesa vem sustentando que o publicitário só atuava na parte de
criação da agência, enquanto os pagamentos eram administrados por
Monica, que está negociando uma delação premiada.
Eles foram alvo da Operação Acarajé — a iguaria baiana era o apelido
usado para “propina”. Como desdobramento das apurações, a Lava Jato
deflagrou em março a Operação Xepa, que revelou a existência de um setor
dentro da Odebrecht instalado para operacionalizar os pagamentos
indevidos a servidores públicos em razão de contratos firmados com a
empresa. Segundo as apurações, os repasses teriam se estendido até
novembro de 2015. Ainda de acordo com as investigações, sistemas
informatizados próprios eram usados para garantir o sigilo dos acertos e
transações.
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