domingo, 24 de abril de 2016


Segundo Monica Moura, mulher do marqueteiro João Santana, Palocci intermediava ‘caixa 2’ e seria o ‘italiano’ mencionado em tabela de propina da Odebrecht



O ex-ministro Antonio Palocci


O ex-ministro Guido Mantega não foi o único integrante de alta cúpula do PT a intermediar pagamento de caixa dois para campanhas presidenciais do partido, segundo Monica Moura, mulher do marqueteiro João Santana. Em depoimento a procuradores federais de Brasília para tentar fechar um acordo de delação premiada, ela disse que o ex-ministro da Fazenda e Casa Civil Antonio Palocci e o ex-tesoureiro petista João Vaccari Neto teriam desempenhado o mesmo papel nas últimas campanhas presidenciais. Os dois teriam indicado a ela executivos de empresas para contribuir em dinheiro. São recursos que não passaram por contas oficiais do PT, sem serem declarados à Justiça Eleitoral.
As empresas do casal Santana prestaram serviços na campanha à reeleição de Lula, em 2006, e nas disputas vencidas por Dilma Rousseff, em 2010 e 2014. Nas três eleições, eles receberam, em contas oficiais, cerca de R$ 110 milhões. Monica diz ter registrado numa agenda, não apreendida pela PF, detalhes de encontros em hotéis e restaurantes para obter recursos adicionais, entregues em malas de dinheiro por interlocutores de executivos indicados pelos três petistas.

TABELA — A mulher de Santana também diz ser capaz de ajudar a PF a esclarecer informações da planilha nomeada “posição-italiano”, apreendida na caixa de e-mail do então diretor da Odebrecht Fernando Migliaccio. O italiano citado como referência para os pagamentos da tabela seria Antonio Palocci. O documento é considerado um prova contundente sobre o pagamento de propina a agentes políticos pela empreiteira. Migliaccio era lotado no Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, área responsável por operacionalizar repasses ilegais no Brasil e no exterior.
A tabela traz a indicação de fontes para pagamentos e siglas de destinatários, como o casal Santana e o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. Em depoimento prestado logo após ser presa, em fevereiro, Monica foi perguntada se sabia dizer quem era o “italiano”; na época, disse que não.
A relação de proximidade com Migliaccio, o autor da tabela, já era admitida por Monica neste mesmo depoimento. Na ocasião, reconheceu ter sido orientada a procurar Migliaccio para receber colaborações não contabilizadas de campanhas feitas no exterior. E confirmou ter mantido contato com ele entre 2011 e 2014. Em março, a ex-secretária da Odebrecht Maria Lúcia Guimarães Tavares reforçou o vínculo do dirigente da empreiteira com Monica. Segundo ela, a mulher de Santana indicava a ele e a outros dirigentes suas contas para receber pagamentos ilegais.
A tabela traz um balanço de como foram repassados, entre 2008 e 2012, cerca de R$ 200 milhões a projetos como as eleições municipais de 2008, a disputa presidencial em El Salvador e valores pagos a JD, que a PF acredita ser Dirceu, e Santana. A planilha termina indicando haver, em 2012, um saldo de R$ 79 milhões. A curto prazo, R$ 6 milhões estariam comprometidos com “Itália” e R$ 23 milhões com o “amigo”, não identificado na tabela. Os demais R$ 50 milhões iriam para o “pós-Itália”.

PALOCCI — Em nota à reportagem, Palocci nega “com veemência” as acusações “feitas contra ele por uma pessoa submetida ao constrangimento da prisão”. O ex-ministro afirmou não ter participado da arrecadação de campanhas em 2006, 2010 ou 2014 e “jamais” ter indicado “a qualquer pessoa meios pelos quais pudessem ser arrecadadas contribuições ilegais”.
Palocci disse que não tem “qualquer relação com a tabela” de Migliaccio. Segundo a nota, o petista “vê com muita estranheza que seja atribuído a si o codinome ‘italiano’, já que este apelido foi vinculado a várias outras pessoas em materiais apreendidos pela PF”. O ex-presidente da Odebrecht Marcelo Odebrecht também cita um “italiano” em e-mails a executivos, mas não é possível saber se é o mesmo citado por Migliaccio.
Palocci já é investigado na Lava-Jato desde junho de 2015, em inquérito que apura denúncia de que ele teria pedido ao ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa R$ 2 milhões para a campanha de Dilma, em 2010. Seu nome foi citado pelo doleiro Alberto Youssef e pelo operador Fernando Baiano. Este mês, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou pedido da defesa de Palocci para anular as duas delações.

Vaccari também negou a acusação.

DE VOLTA — O relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, o ministro Teori Zavascki decidiu devolver ao juiz federal Sergio Moro, em Curitiba, as investigações relacionadas à Operação Acarajé — cujo alvo principal foi o marqueteiro João Santana, que encabeçou campanhas de Lula e Dilma, e a mulher dele, Monica Moura — e à Operação Xepa, derivada da anterior. Moro havia submetido as apurações ao Supremo.
Teori, ao determinar a remessa das investigações de volta a Moro, considerou que todos os atos do juiz nas referidas apurações foram legais e dentro da prerrogativa que cabe à Justiça Federal. O ministro não modificou ou fez qualquer reparo a nenhuma prisão ou outras determinações de Moro no âmbito das operações Acarajé ou Xepa. Ficaram mantidas, portanto, a prisão de João Santana e Monica Moura, detidos desde o fim de fevereiro.
O casal se entregou à Polícia Federal ao aterrissar em Guarulhos (SP) vindo da República Dominicana, onde Santana trabalhava na campanha de reeleição de Danilo Medina, do Partido de Libertação Dominicana (PLD).
A defesa vem sustentando que o publicitário só atuava na parte de criação da agência, enquanto os pagamentos eram administrados por Monica, que está negociando uma delação premiada.
Eles foram alvo da Operação Acarajé — a iguaria baiana era o apelido usado para “propina”. Como desdobramento das apurações, a Lava Jato deflagrou em março a Operação Xepa, que revelou a existência de um setor dentro da Odebrecht instalado para operacionalizar os pagamentos indevidos a servidores públicos em razão de contratos firmados com a empresa. Segundo as apurações, os repasses teriam se estendido até novembro de 2015. Ainda de acordo com as investigações, sistemas informatizados próprios eram usados para garantir o sigilo dos acertos e transações.




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