O PAC do trem fantasma
Um trem fantasma circula entre Campinas e Rio de Janeiro, correndo nos
trilhos imaginários do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Prometido inicialmente para este ano, o trem-bala nunca saiu da
promessa, continua como um vago projeto e, assim mesmo, seu status
aparece como "adequado" no 10.º balanço do PAC, apresentado na
sexta-feira pela ministra do Planejamento, Míriam Belchior. Em agosto do
ano passado o leilão do trem de alta velocidade, com percurso de 511
quilômetros e custo estimado de R$ 32 bilhões, foi adiado pela terceira
vez. Mas oficialmente o projeto está em dia.
Bastaria essa classificação para minar a credibilidade de mais um
balanço triunfal de realizações federais. Mas outros dados comprovam,
mais uma vez, o baixo grau de sucesso de um programa destinado
principalmente, como indica seu nome, a ampliar a capacidade de expansão
da economia brasileira.
O novo relatório comprova, mais uma vez, a predominância dos gastos com
habitação no mais vistoso programa do governo central. A execução
orçamentária do PAC 2 até 30 de abril deste ano envolveu aplicações de
R$ 871 bilhões, 84,6% do total previsto para o período 2011-2014. Os
financiamentos habitacionais, R$ 285,3 bilhões, corresponderam a 32,7%
do valor aplicado. Nem sequer se poderia classificar esse montante como
investimento, até porque o dinheiro pode ter sido gasto, no todo ou em
parte, em imóveis velhos.
Somando-se a isso as aplicações do programa Minha Casa, Minha Vida, R$
78 bilhões, chega-se a R$ 361,6 bilhões, ou 41,7% dos R$ 871,4 bilhões
comprometidos entre 2011 e o fim de abril. O resto é dividido entre os
demais setores, com destaque para os de energia e de transportes.
Não há como desmentir: o PAC é essencialmente um conjunto de
financiamentos e investimentos habitacionais. Os programas de moradia
podem ser importantes socialmente, economicamente úteis e louváveis sob
vários aspectos, mas a aceleração do crescimento, finalidade explícita
do programa, depende muito mais de investimentos em infraestrutura.
Os dispêndios das estatais, R$ 231,4 bilhões desde o início do PAC 2 até
30 de abril, corresponderam a 26,6% das aplicações totais. Somados os
gastos do Orçamento-Geral da União chega-se a R$ 324,2 bilhões, valor
bem menor que o dedicado à habitação.
Como explicar o peso desproporcional dos gastos com habitação? A
resposta provavelmente envolve a dificuldade muito maior de planejar,
projetar e executar obras de estradas, ferrovias, portos, armazéns,
aeroportos, centrais elétricas, sistemas de transmissão e de pesquisa,
exploração e refino de petróleo.
A escassa competência do governo federal no tratamento dessas questões
já foi comprovada muitas vezes, especialmente a partir do primeiro PAC.
Muitos projetos emperram antes de sair do papel, ou já nas primeiras
fases de execução, por descumprimento, por exemplo, dos padrões
financeiros cobrados pelo Tribunal de Contas da União. Outros emperram
por má administração ou mesmo por falhas escandalosas de planejamento,
como, por exemplo, nos casos de centrais elétricas impedidas de
funcionar por falta de linhas de transmissão.
O PAC nunca foi, de fato, mais que uma sigla usada para marketing
político. Desde a primeira versão, esse nome serviu basicamente para
designar uma colcha formada pela costura apenas formal de várias ações
desenvolvidas, em nível federal, pela administração direta e pelas
várias estatais.
Já existiam os grandes projetos do setor elétrico. O planejamento da
Petrobrás, periodicamente revisto e atualizado, era parte da rotina da
empresa. As necessidades do setor de transportes eram conhecidas e obras
importantes estavam em execução. O PAC nada acrescentou a esse
conjunto, além de um nome de fantasia e de uma bandeira de propaganda.
Esse programa - ou "programa" - teria algum valor prático se tivesse ao
menos servido para introduzir maior racionalidade no planejamento
federal. Nada semelhante ocorreu. Ao contrário: a qualidade gerencial
decaiu, como ficou demonstrado com a desastrosa intervenção na política
de tarifas de energia, com a manutenção do controle de preços da
Petrobrás e com o uso das estatais para remendar as contas públicas. O
resto é propaganda ruim, nem sequer enganadora.
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