domingo, 16 de outubro de 2011


Lençol de lixo hospitalar dos Estados Unidos é revendido no Brasil

Lençóis com nomes de hospitais dos Estados Unidos, semelhantes aos encontrados nesta semana pela Receita Federal no porto de Suape e classificados como lixo hospitalar, são vendidos por quilo em Santa Cruz do Capibaribe, cidade localizada a 205 quilômetros de Recife, em Pernambuco. A Receita Federal apreendeu dois contêineres, na terça-feira(11) e na quinta-feira(13), com 46 toneladas de resíduos hospitalares originários dos Estados Unidos que eram descritos em documentos como "tecido de algodão com defeito". Nos compartimentos, no entanto, foram encontrados lençóis manchados de sangue e seringas, entre outros. O material é proibido de entrar no Brasil e oferece risco à saúde. Especialistas dizem que lençóis só podem ser reaproveitados após rigoroso processo de esterilização. Neste ano, a mesma importadora já havia trazido para Pernambuco outros seis carregamentos, que não foram retidos na fiscalização.
A reportagem do jornal Folha de S. Paulo esteve na quinta-feira - 13 de outubro - na cidade do agreste pernambucano para onde seriam levados os detritos importados apreendidos. Lá, comprou na loja de tecidos e retalhos Império do Forro de Bolso, sem se identificar, nove lençóis. Três peças têm nomes de hospitais ou entidades americanas impressos no tecido. Uma tem a mesma origem de parte do material apreendido no porto, o Hospital Central Services Cooperative. No total, a reportagem do jornal Folha de S. Paulo comprou 4,1 kg de lençóis, a R$ 10,00 o quilo. Funcionários da loja alegaram "problemas no sistema" para não entregar nota fiscal nem recibo. Depois de conversarem ao celular, eles fecharam o local. A loja fica em uma das principais avenidas de Santa Cruz do Capibaribe, cidade com 87,5 mil habitantes em 2010, segundo o IBGE.
Os lençóis e fronhas estavam amontoados no chão. Tecidos para fazer forros de bolso eram vendidos a R$ 8,75 o quilo. Várias peças das roupas de cama tinham manchas. Um dos lençóis comprados pelo jornal Folha de S. Paulo trazia a inscrição "Baltimore Washington Medical Center University of Mariland Medical System". Outro tem inscrição dizendo que não pode ser vendida: "Property - not for sale". Entre os lençóis sem inscrição, quatro têm etiquetas do fabricante. Dois deles são da americana Medline Industries Inc. Há lençóis fabricados em outros países. Após verificar a mercadoria, às 11h20, a reportagem do jornal Folha de S. Paulo voltou à loja, mas ela continuava fechada. À tarde, ninguém atendeu ao telefone. A Hospital Central Services Cooperative é uma empresa não lucrativa (ong).
A Receita Federal aguarda a chegada de mais 14 contêineres dos Estados Unidos encomendados pela mesma confecção de Santa Cruz do Capibaribe que importou 46 toneladas de lixo hospitalar retidas nesta semana no porto de Suape, no Estado de Pernambuco. De acordo com o inspetor chefe da alfândega da Receita Federal local, Carlos Eduardo Oliveira, os contêineres estão em um navio e deverão chegar em uma semana. O conteúdo dos contêineres ainda é desconhecido. De acordo com o inspetor chefe, a empresa exportadora pode fazer essa declaração até cinco dias antes de o navio atracar em seu destino. A confecção responsável pela importação, chamada Na Intimidade, adquiriu neste ano oito contêineres dos Estados Unidos. Os dois últimos carregamentos foram apreendidos após a Receita Federal desconfiar do valor da nota. Aos inspecionar, descobriu se tratar de lixo hospitalar. Oliveira disse que não poderia confirmar se foi a Forro de Bolso - onde a Folha adquiriu os lençóis - que importou as 46 toneladas de lixo hospitalar dos EUA. Mas disse que a descrição das peças compradas pela Folha na loja de tecidos se assemelha com as que estão retidas em no porto de Suape desde o início da semana.
A University of Maryland Medical Center (Centro Médico da Universidade de Maryland) divulgou nota dizendo:
"Nós pagamos várias empresas para processar e lidar com os resíduos do hospital. Esperamos que nossos fornecedores cumpram as leis sobre o descarte desses itens. Estamos interessados em saber mais informações sobre esse caso assim que houver detalhes disponíveis".
A NYC Health and Hospitals Corp (Corporação de Saúde e Hospitais da Cidade de Nova York) também disse não ter conhecimento sobre o caso do lixo hospitalar.
O dono original da Forro de Bolso é Altair Teixeira Moura, que fundou as lojas Forrosão dos Retalhos. Ele é um "importador" desde 2001. Em 2009, após se afastar da empresa antiga, ele fundou uma outra, chamada Na Intimidade, e também passou a "importar" lixo hospitalar americano. Ele vende bolsos para a indústria textil colocar nos jeans produzidos no Brasil, nos shorts e bermudas. E também fazem exportações para Angola. As peças contaminadas que vêm dos hospitais norte-americanos são lavadas na "fábrica" em Santa Cruz do Capibaribe. A água contaminada é despejada na rede da cidade, e é a água que a população vai beber depois, inclusive a de Recife.


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